Rodrigo Caio nega perfil ‘mimado’ e diz ter sofrido preconceito na base

Aos 20 anos, Rodrigo Caio tem sido o destaque do São Paulo no segundo semestre de 2013. Em meio à crise, manteve a titularidade entre o fim da passagem de Ney Franco, dois meses de Paulo Autuori e a chegada de Muricy Ramalho. Há menos de um mês, ele passou a ter a carreira agenciada pelo português Jorge Mendes, mesmo empresário do astro Cristiano Ronaldo, do Real Madrid (ESP). Na semana passada ele falou ao UOL Esporte sobre vida e carreira. Visto por torcedores rivais como “mauricinho”, ele nega o rótulo e diz que até enfrentou algum preconceito por não atender ao estereótipo do jogador de futebol.

Zagueiro e volante, Rodrigo Caio nasceu em Dracena, a 650 km da capital paulista. Com 12 anos, deixou a cidade para seguir carreira no clube, em Cotia. Quando completou 18, saiu do quarto no CT da Barra Funda e alugou um apartamento – no qual vive sozinho. Hoje, faz as compras da casa no supermercado e se arrisca até a cozinhar. Com a família na cidade natal e um namoro à distância, vê como passageiro o período solitário, mas diz que está gostando.

Rodrigo conta que apesar da pele clara, dos cabelos lisos e da boa argumentação, não teve vida fácil. A primeira medida que tomou ao assinar seu primeiro contrato profissional foi tirar o pai do mercado em que trabalhava, em Dracena. Deu uma casa e um carro à família, mas não conseguiu fazer a mãe abandonar a carreira como professora de escolas públicas. Para si mesmo, comprou o carro que queria após economizar o que ganhou com ‘bichos’ em vitórias do São Paulo.

Ele chegou a começar faculdade de Educação Física, mas trancou o curso quando foi promovido ao elenco profissional, em 2011. No futuro, pensa em retomar ou até mudar de área.

UOL Esporte: Você nasceu em Dracena e deixou a cidade para ser jogador do São Paulo. Como isso aconteceu? Quantos anos tinha?

Rodrigo Caio: Comecei a jogar com sete anos de idade em uma escolinha, em Dracena. Desde então meu sonho sempre foi jogar no São Paulo, porque sou são-paulino desde criança. Era o sonho do meu pai, que é são-paulino roxo. Até que surgiu um peneirão do São Paulo em Dracena. E eu fui fazer, tinha de dez para 11 anos. Eles gostaram de mim e de mais quatro jogadores. A gente veio fazer testes, passei no primeiro, segundo e terceiro. No quarto, eles disseram que queriam que eu ficasse alojado em Cotia. Aí aceitei.

UOL Esporte: E foi simples? O que seus pais disseram quando você disse que queria?
Rodrigo Caio: 
Foi muito difícil no começo. Coloquei na cabeça que era o que eu queria, perder uma infância de diversão para assumir uma responsabilidade. Arrisquei. Meu pai me dava um pouco mais de apoio. Não que minha mãe não desse, mas é aquela coisa de mãe. Ela queria ter o filho ao lado dela. Mas foi se acostumando. Ela é professora, e naquela época teve que vir dar aula em Itapevi (a 35 km da capital). Então ela ficou mais próxima. Não tanto quanto ela gostaria, mas pôde ter mais contato comigo.

UOL Esporte: Você já deve ter ouvido comentários que o chamam de “mauricinho”, “mimado”. Como era a vida da sua família antes de você se profissionalizar? Tinham casa própria, conforto?
Rodrigo Caio: 
Não, totalmente diferente. Olha para minha cara, acha que eu era uma pessoa assim? Não. Quando saí da minha cidade, meu pai era comerciante, tinha um mercado e a única coisa que falei para ele foi: “Pai, no primeiro contrato que eu fizer eu vou te tirar desse mercado”. O pouco dinheiro que a gente tinha ia todo para lá, e só ferrava com a nossa vida. Minha mãe era professora, mas a gente não tinha casa própria, nem nada. Nessa época de Itapevi a gente foi até morar com minha avó, porque nossa casa em Dracena era grande e a gente pagava um aluguel muito alto. O que me fortaleceu sempre foi querer melhorar a vida dos meus pais.

UOL Esporte: E por que acha que é visto por alguns dessa maneira, como mimado?
Rodrigo Caio:
 É pela fisionomia. Não sou assim. Longe disso, tudo que consegui foi no meu esforço. Não foi nada fácil. Saí com 12 anos da minha cidade e com 15 anos tive uma lesão absurda no joelho direito. Fiquei dez meses parado, estourei a rótula, me disseram que eu não iria jogar mais futebol. Eu estava muito bem, tinha acabado de assinar contrato. Foi muito difícil. Muitas pessoas falam sem saber o passado, sem saber como você surgiu e sem saber como conseguiu tudo.

UOL Esporte: Você chegou a sofrer preconceito nas categorias de base por ter pele clara, cabelos lisos e pelo nome?
Rodrigo Caio: 
Acho que sim, um pouco. Quando você chega num clube grande, sempre tem os jogadores da casa, conhecidos pelos técnicos. Você chega lá e o pessoal diz “você não vai ser melhor que ele”. Mas é trabalho. Você supera na bola.

UOL Esporte: Como é sua vida hoje? Seus pais estão em Dracena?
Rodrigo Caio:
 Meus pais moram em Dracena, eu moro sozinho aqui em São Paulo. Até ano passado morava no CT, mas queria ter minha liberdade e aluguei um apartamento.

UOL Esporte: Hoje é você que sustenta sua família?
Rodrigo Caio:
 Não sei se sustento. Digo que eu ajudo muito. Consegui tirar meu pai do mercado. Agora ele trabalha em vendas, não tem preocupação. Falei para minha mãe, não quero que ela fique sofrendo. Mas professora é complicado, ela não quer, não para. Ela dá aula em Dracena e na região próxima, ela gosta muito. Dei uma casa e um carro para meus pais, e sonho em poder dar mais. Estamos bem, graças a Deus.

UOL Esporte: Você é religioso?
Rodrigo Caio: 
Sou, bastante. Sou católico, mas tenho minha própria religião, meu próprio jeito de acreditar. Não vou muito à igreja, nem nada. Acho que isso é essencial na vida.

UOL Esporte: E o carro que você dirige, comprou na mesma época?
Rodrigo Caio:
 Quando comecei a jogar mais, eu ganhei os primeiros ‘bichos’. E fui guardando. Sempre fui muito econômico. E aí tive vontade de comprar um carro, mas não sabia dirigir. Mas ia para minha cidade e pegava um pouco o carro lá. Fui economizando, guardei um dinheiro bom e aí lançou um carro que eu gostei, o Hyundai Veloster. Paguei à vista com os bichos.

UOL Esporte: Além da família longe, sua namorada também não mora em São Paulo?
Rodrigo Caio:
 Namoro há um ano e oito meses. Ela é da minha cidade e namoro à distância. Mas ela é muito parceira. Quando você escolhe alguém pra ficar ao seu lado, tem que ser uma menina parceira. Se é difícil para ela, é difícil para mim também, porque não quero ficar longe.

UOL Esporte: Conhecia ela desde pequeno em Dracena?
Rodrigo Caio: 
Não. Eu só conhecia de vista, mas nunca tinha conversado. Conheci nas minhas férias de 2011 para 2012. Conheci, gostei, e estamos até hoje. Sou muito feliz, porque ela é muito parceira e me ajuda muito.

UOL Esporte: Não pensa em trazê-la para São Paulo, para morarem juntos?
Rodrigo Caio:
 Ela faz odontologia em Presidente Prudente e falta só um ano e meio para terminar a faculdade. E ela se dedica muito, não pode sair de lá agora. Falo isso para ela: “Você tem que ter sua profissão, tem que lutar por seu objetivo”.  Deixo claro. Mas um dia, quem sabe, futuramente, ela venha morar comigo. Eu gosto muito dela e tenho esse pensamento.

UOL Esporte: Você também chegou a começar faculdade. Pensa em retomar?
Rodrigo Caio: 
Comecei em Cotia, Educação Física, mas logo em seguida subi para o profissional e tive que trancar. Fiz um mês e meio. No futuro penso em continuar, ou fazer alguma outra coisa quando parar de jogar.

UOL Esporte: Hoje, como funciona sua vida? Como faz para morar sozinho? Vai ao mercado? Cozinha? Quem te ajuda?
Rodrigo Caio:
 Sou muito tranquilo, gosto de ficar em casa sozinho, assistindo TV. Acompanho novela, vejo filmes e tento passar o tempo. Tenho uma diarista, vai ao apartamento duas vezes por semana. Ela compra alguma coisa que precisa, mas na maioria das vezes eu que vou ao mercado e compro as coisas que eu quero. As partes de carnes meus pais que trazem de Dracena, eles sabem mais. A diarista cozinha, deixa a comida no freezer, mas às vezes eu cozinho, me viro. Já arrisquei arroz, macarrão. Fica bom, ligo para minha mãe e ela vai me explicando no viva voz. Fica gostoso.

UOL Esporte: As pessoas te reconhecem no supermercado? Você gosta da fama?
Rodrigo Caio:
 Bastante. Pessoal vem conversar, elogiar às vezes. Fico muito feliz. Torcida vem tirar foto e tento ser atencioso, carismático, porque são pessoas que torcem pelo nosso bem. É uma consequência. É natural. Eu gosto, acho que é o reconhecimento do trabalho.

UOL Esporte: Sente que a boa fase no São Paulo fez com que essa fama crescesse também dentro do elenco? Você é mais respeitado hoje do que era há um ano?
Rodrigo Caio: 
Acho que sim. Acho que é a sequência de jogos. Quando o trabalho é bem feito, muda bastante coisa. Mas não posso parar. Quando você pensa que está bom, as coisas param de dar certo. Quando cheguei em 2011, sabia que estava muito abaixo de todos os jogadores. Então procurei pegar um pouco e cada jogador aqui, para aprender.

UOL Esporte: Só agora você passou a trabalhar com um empresário. Por que não aceitou ofertas antes?
Rodrigo Caio: 
Eu nunca pensei em ter empresário. Como era capitão e me destacava bastante, sempre tive propostas. Sempre teve gente oferecendo dinheiro. Mas queria assinar com a pessoa certa, e eu deixava isso com meus pais, sabia que eles iriam me guiar para o melhor lugar. Eu não precisava naquele momento. Agora estou com o Luizão, com o Jorge, e gostei. Eles me ofereceram um trabalho, mostraram que posso conseguir coisas boas se continuar minha evolução.

UOL Esporte: Jorge Mendes é famoso por ser o empresário mais poderoso do futebol, trabalha com Cristiano Ronaldo. Você pensa em trilhar uma carreira na Europa com isso?
Rodrigo Caio:
 Sempre quis fazer uma carreira de muito tempo no São Paulo. De ser reconhecido por todos aqui, e continuo com esse pensamento. Me firmei nesse ano. Aqui é uma vitrine muito grande. Sou titular, jovem e estou no São Paulo. Se ficar assim, sempre terei mercado grande lá fora. E isso é uma decisão que vou ter com meus pais no futuro, lá na frente, porque hoje o pensamento é vestir a camisa do São Paulo com todo o orgulho que tenho de jogar nesse time.

UOL Esporte: Entre seleção brasileira e um grande clube europeu, qual o primeiro objetivo?
Rodrigo Caio: 
Seleção, com certeza. Pude jogar na sub-20, é uma emoção muito grande. Jogar contra a Argentina… É muito bom. Estou no time certo, na vitrine certa, quem sabe futuramente a gente consiga isso.

UOL Esporte: Depois de ter sido capitão da seleção sub-20, pensa nos Jogos Olímpicos de 2016?
Rodrigo Caio:
 Sim, meu pensamento é em 2016. Acredito muito no meu potencial, sei que se estiver bem no meu clube vou conseguir meu objetivo. Para mim, vai ser a hora de deslanchar.

UOL Esporte: Como você se imagina, no futebol, daqui a dez anos?
Rodrigo Caio:
 Não sei, é difícil. Hoje meu pensamento é aqui. É meu time do coração, time que eu me identifico e onde eu quero jogar por muito tempo.

UOL Esporte: E se você não tivesse passado naquela peneira em Dracena? O que você seria se não fosse jogador?
Rodrigo Caio: 
Estudar não era comigo. Sempre deixei claro para minha mãe. E ela era professora. “O que vou fazer se não for jogador?” E ela dizia: “Meu filho, pode se aplicar na escola”. Mas brincava sempre com ela, se não fosse jogador seria catador de lixo.

UOL Esporte: Como jogador, quais fundamentos você acha que evoluiu de um ano para cá? E o que acha que ainda pode evoluir?
Rodrigo Caio:
 Cabeceio, sempre tive muito forte, desde a base, e estou evoluindo. Quando cheguei em 2011, era muito cru. Minha dedicação foi para ter mais velocidade, tocar rápido, ter movimentação rápida. Eu precisava de dinâmica, de tática. No passe vejo uma evolução muito grande. Na base eu errava muito. Eu procuro sempre evoluir. Eu me cobro muito, se eu erro fico p… comigo mesmo.

UOL Esporte: Assiste aos próprios jogos para ver os erros?
Rodrigo Caio:
 Assisto, vejo lances, melhores momentos. Vejo sempre jogos das pessoas que vou ter que marcar. E tento prestar atenção em quem vai estar do meu lado.

UOL Esporte: Gosta de assistir a jogos de futebol ou prefere outras coisas?
Rodrigo Caio:
 Assisto bastante. Eu gosto de ver futebol. Mas gosto bastante de filme, de novela. E assisto muito tênis. Mas só joguei uma vez. Não dá tempo, não tem como. Mas é um esporte que admiro muito.

UOL Esporte: Com pouco mais de dois anos entre os profissionais, você já teve seis treinadores. Quais te ajudaram mais?
Rodrigo Caio:
 Gostei muito do Adilson Batista. Para mim, um bom técnico. Tive pouco do Muricy até agora, mas o Paulo Autuori é fundamental. Ele é sensacional. Como pessoa, como treinador. Um cara que ensina muitas coisas. Queria ter trabalhado com ele quando cheguei no profissional, porque eu teria evoluído muito. Espero que ele consiga mais sucesso ainda do que já teve. Dos técnicos, acho que todos se espelham nele. Seria injusto da nossa parte não correr por um cara como ele. Grande pessoa.

UOL Esporte: E com o Muricy? Se todos gostavam do Autuori, qual a diferença para vencer com Muricy?
Rodrigo Caio: 
Ele tem estrela. É vencedor e tem estrela. Acho que nossa sorte estava complicada. Ganso falou isso, até. Antes a bola batia na trave e ia para fora. Agora está entrando. Muricy dispensa comentários. Conseguiu dar confiança para o nosso time, conseguiu reerguer. Espero que seja só o começo, e acho que podemos chegar entre os quaro primeiros, no topo da tabela.

UOL Esporte: Até agora, falava-se em escapar do rebaixamento. Mudou a meta? É possível ainda brigar entre os primeiros?
Rodrigo Caio:
 Acho que dá. Conseguimos três vitórias, por que não pensar em mais cinco ou seis vitórias? Deixaria a gente lá em cima.

UOL Esporte: O que achou das declarações do Ney Franco, que disse ao jornal O Globo que não teve em Rogério Ceni o capitão que ele queria, e que o goleiro ‘fritou’ Ganso e Lúcio?
Rodrigo Caio:
 Eu não entendi porque ele disse isso. Rogério sempre apoia todo mundo. Acho que ele foi um pouco infeliz nas palavras. Hoje o Ney está no Vitória e está bem. A gente torce pelo sucesso dele. Trabalhei com ele na seleção e aqui, torço por ele.

 

Fonte: Uol

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