Gestão Ineficiente do Futebol do São Paulo, biênio 2021/22

O Relatório da Administração que acompanha os Demonstrativos Financeiros do São Paulo Futebol Clube, referentes ao ano de 2022, apresenta uma visão extremamente otimista quanto ao desempenho de nossa equipe de futebol profissional nos anos de 2021 e 2022, período sob comando da atual gestão do Clube.

Eu discordo dessa avaliação otimista, mostrarei que nosso desempenho foi na verdade muito fraco, e, como em períodos anteriores, deixarei claro que o mau desempenho não se deve à falta de recursos para investimento na equipe de futebol.  Começo fazendo uma correção nos números apresentados, que contém um equívoco.

Preliminar: correção dos dados apresentados no Relatório de Administração

Julio Casares assumiu a Presidência do SPFC em 1º de janeiro de 2021, e já havia trabalhado, junto com seu Diretor Institucional de Futebol, Carlos Belmonte, em um período de transição de comando da modalidade. Dessa forma, todo e qualquer jogo a partir da sua posse tem que ser computado nas estatísticas da atual gestão.

Ao fazer o levantamento de desempenho, entretanto, o responsável pelo relatório esqueceu de incluir 11 partidas, ocorridas entre 6 de janeiro e 25 de fevereiro de 2021, relativas à desastrosa reta final do Campeonato Brasileiro de 2020.

Se o Tricolor tivesse conquistado o título Brasileiro de 2020, que esteve muito próximo do Morumbi, Casares com certeza incluiria a conquista entre os pontos positivos de sua administração, perdendo, não pode apagar da história esses jogos sob seu comando. O resultado dessas partidas, 2 vitórias, 4 empates e 5 derrotas, 10 pontos somados em 33 disputados (30% de aproveitamento), altera os percentuais de aproveitamento do time sob a atual administração, como mostrado na figura acima.

Comparativo de Desempenho Esportivo

Para comparar o desempenho entre diferentes equipes precisamos de um critério comum, que permita avaliar todos de forma equalitária. A melhor “régua” para esse comparativo é o desempenho em jogos do Campeonato Brasileiro da Série A, competição que toma oito meses do calendário e opõe diretamente as equipes envolvidas no estudo. Os Estaduais e Copas, pelo desnível técnico de alguns participantes e por terem um desequilíbrio no número de jogos, não são considerados nesta análise, pois podem distorcer os resultados.

Adotamos como critério de entrada no comparativo uma equipe ter disputado a Série A do Campeonato Brasileiro nas temporadas de 2020 (estendida para 2021), 2021 e 2022, e que não tenham sido rebaixadas neste último ano. Apenas onze times se qualificaram por esses critérios. Abaixo o desempenho esportivo de cada um deles.

Cada um dos times realizou 87 jogos pelo Brasileiro da Série A no período considerado, sendo 38 jogos por ano referentes às temporadas 2021 e 2022, e 11 partidas jogadas em 2021, mas relativas ao torneio de 2020. Palmeiras e Flamengo realizaram um jogo a mais, totalizando 88 jogos, o que não altera as conclusões deste estudo.

No biênio 2021/22, o São Paulo Futebol Clube teve o pior desempenho acumulado entre todos os times que jogaram a Série A e não foram rebaixadas no período considerado. Empatamos na pontuação com o Santos, mas o “Peixe” teve duas vitórias a mais. O aproveitamento acumulado de 43% reflete bem o desempenho de um time que esteve sempre lutando na parte baixa da tabela nas duas últimas temporadas. Tivemos o segundo pior ataque, superando apenas a equipe santista, e nossa defesa foi a terceira pior entre os analisados.

Leitores desatentos poderão argumentar que, devido à elevada dívida recebida de herança de seu antecessor, Julio Casares não teve condições econômicas para investir no time, e por isso o desempenho da equipe decepciona. Essa visão está equivocada. Na próxima seção mostrarei que o mau desempenho do time não está relacionado à falta de recursos.

Comparativo de Eficiência: pontos acumulados x valor gasto por equipe

O conceito de eficiência em gestão do futebol é relativo a obter bons resultados com o menor gasto possível. A tabela abaixo mostra o quanto cada clube gastou com suas equipes de futebol, no acumulado dos anos 2021 e 2022. Um indicador que já utilizo há alguns anos é o valor gasto por cada ponto conquistado em jogos do Brasileiro da Série A. Vejam os resultados.

O Tricolor está entre os cinco clubes que mais gastaram com seus times de futebol no biênio 2021/22, mas seus resultados foram inferiores ao de adversários que investiram muito menos. Com um gasto de R$ 870 milhões e 112 pontos somados em jogos do Brasileiro, cada ponto conquistado pelo SPFC custou R$ 7,8 milhões. Após 8 anos sem nenhuma conquista, O São Paulo ganhou o Campeonato Paulista 2021, encerrando uma incômoda fila de 15 anos sem vencer o Estadual.

Gastaram mais do que o Tricolor apenas os três times que conquistaram o Brasileiro no período considerado, Flamengo, Palmeiras e Atlético-MG, e o Corinthians.

Adicionalmente a uma conquista de Brasileiro (temporada 2020, encerrado em 2021), o Flamengo venceu no período uma Libertadores (jogando a final contra o Athlético-PR) e uma Copa do Brasil (vencendo na final o Corinthians), ambas em 2022, além de do Estadual do Rio de Janeiro em 2021. O Rubro-negro da Gávea é o único time que apresentou um custo médio mais elevado por ponto conquistado no Brasileirão, em parte explicado pela priorização das Copas no ano de 2022.

O Palmeiras, em jogos da Série A do Brasileiro, teve eficiência econômica equivalente à do São Paulo. O Alviverde gastou 44% a mais com seu time de futebol, conquistando 44% mais pontos. O custo médio por ponto foi igual ao do Tricolor, de R$ 7,8 milhões. No biênio considerado, o “Palestra” foi campeão Brasileiro de 2022, da Copa do Brasil (2020, finalizada em 2021) e conquistou um bicampeonato da Libertadores (2020, com final em 2021 e da temporada 2021) batendo respectivamente o Santos e o Flamengo.

O Atlético-MG gastou 14% a mais do que o São Paulo, para somar 44% mais pontos em jogos do Brasileiro da Série A. Cada ponto somado pelo “Galo” custou R$ 6,1 milhões, um valor 21% inferior ao do SPFC, indicando melhor eficiência na aplicação de recursos. O Atlético-MG foi ainda campeão do Brasileiro e da Copa do Brasil em 2021 (ganhando na final do Athlético-PR), e confirmou a hegemonia no seu Estadual com dois títulos.

O Corinthians gastou 3% a mais do que o São Paulo, para somar 20% mais pontos em jogos de Campeonato Brasileiro. Os pontos do Alvinegro custaram, em média, 14% a menos do que os do Tricolor. Com investimento bem parecido ao do São Paulo, o time de Parque São Jorge conseguiu classificação direta à fase de grupos da Libertadores nos dois últimos anos, fase em que o SPFC se limitou a obter vaga na Sul Americana.

A partir daqui todos os clubes gastaram menos do que o São Paulo no biênio 2021/22, e alcançaram melhor desempenho acumulado em jogos da Série A de Campeonato Brasileiro. Vejamos cada um.

Internacional: com um gasto 34% menor do que o do SPFC, conquistou 29% mais pontos. O valor médio de cada ponto somado foi de R$ 4,0 milhões, praticamente a metade do custo do Tricolor. O “Colorado” terminou o Brasileiro à frente do São Paulo em todas as edições que fizeram parte deste estudo.

Athlético-PR: gastou 39% menos do que o Tricolor, para somar 11% mais pontos. O valor médio por ponto somado foi de R$ 4,3 milhões, eficiência muito próxima à do Internacional, e equivalente a 56% do custo do São Paulo. O “Furacão” ganhou ainda a Copa Sul-Americana de 2021, em final “doméstica” contra o Bragantino.

Fluminense: o time das Laranjeiras teve despesa 45% inferior ao do São Paulo, somando 32% a mais de pontos em jogos de Série A do Brasileiro no biênio 2021/22. Dessa forma, cada ponto do Fluminense custou R$ 3,2 milhões, correspondente a 42% do custo médio do SPFC. O time ganhou ainda o Campeonato Carioca de 2022, derrotando na final o Flamengo.

Santos: o “Alvinegro da Vila Belmiro” teve campanha equivalente à do São Paulo no período considerado, com 43% de aproveitamento dos pontos disputados pelo Campeonato Brasileiro, levando vantagem apenas no critério de desempate de número de vitórias. Para isso, entretanto, gastou com seu time de futebol a metade do que foi dispendido pelo Tricolor do Morumbi, resultando na média de R$ 3,9 milhões gastos por ponto ganho. Os dirigentes santistas lograram obter o dobro da eficiência na aplicação dos recursos em comparação com seus pares do SPFC.

Red Bull Bragantino: a SAF criada a partir do time de Bragança Paulista trabalha com orçamento bem administrado e equipe comandada por profissionais. O RB Bragantino, teve campanha 9% superior à do SPFC, com dispêndio de um valor equivalente a 38% do gasto do São Paulo. Cada ponto do time custou R$ 2,7 milhões, o segundo menor valor entre as equipes do comparativo.

Fortaleza: fez campanha 10% superior à do SPFC, em termos de pontos somados, com um gasto total equivalente a apenas 30% do que foi gasto pelo São Paulo. Cada ponto somado pelo Fortaleza custou R$ 2,1 milhões. O “Leão do Pici” foi um modelo de eficiência na gestão de futebol, tendo terminado com a oitava melhor campanha entre os onze clubes qualificados para o comparativo, mesmo tendo um investimento baixíssimo se comparado a times como São Paulo e Santos, que fizeram campanha muito inferior. Além da boa campanha em Brasileiros, o Fortaleza conquistou os dois Estaduais do CE (2021 e 2022) e a Copa do Nordeste 2022.

Conclusão

Equipes com investimentos muito menores alcançaram desempenhos esportivos mais relevantes do que o São Paulo Futebol Clube no biênio 2021 / 2022. Isso mostra que o fraco desempenho não se explica pela falta de recursos para investir no time, mas sim pela baixa eficiência com que os recursos disponíveis são empregados.

O quadro abaixo mostra graficamente tudo o que comentamos nos parágrafos anteriores.

Com uma administração mais austera, gestão mais eficiente, seria possível manter um bom nível de competitividade enquanto se reduz o endividamento da Instituição.

Os quase R$ 300 milhões que gastamos a mais do que o Internacional de Porto Alegre, ou os quase R$ 400 milhões gastos a mais do que o Fluminense em dois anos de gestão Casares, sem nenhum resultado esportivo mais relevante do que esses clubes, poderiam ser canalizados para a redução da dívida do Clube.

Essa, porém, não parece ser uma prioridade da atual gestão.

5 comentários em “Gestão Ineficiente do Futebol do São Paulo, biênio 2021/22

  1. Impressionante. O santos conseguiu o mesmo número de pontos no biênio 21/22 gastando metade. o fortaleza fez mais gastando menos de um terço. Outra administração desastrosa assolando o Tricolor.

  2. É uma péssima gestão do dinheiro, eu venho falando a anos, o Raí teve muita grana e depois o Belmonte e temos um time pífio, nota 5. Passamos também por péssimos treinadores, treinador ruim faz com que o time deixe pelo caminho de 10 a 15 pontos em um campeonato brasileiro.

    A receita é ter diretoria que entende de bola, bom técnico, pagar em dia que com esse budget iria colher bons frutos e não ficar brigando contra o rebaixamento como tem sido rotina.

    Em tempo: mais uma brilhante coluna do amigo Flávio Marques.

  3. Bom dia Flávio e Paulo… Gostei muito da sua criatividade ao formatar uma Tabela de Investimento x Pontos Ganhos. A tabela apura o resultado performático da gestão. A conclusão é que os investimentos “continuam” sendo realizado de forma inadequada. O resultado prático todos sabem… Noves-fora o Paulistinha, vencido ainda na era Crespo, o restante do resultado esportivo continua tão fraco como o obtido pelo Sr. Leco, o pior Presidente do São Paulo em todos os tempos. Obrigado Flávio por lançar luz sobre os números e assim ajudar na avalição da gestão Casares, que está lançando a campanha de reeleição, depois de na campanha realizada em 2020 se dizer contrário a alteração do Estatuto no que tange à extensão dos mandatos presidenciais.

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