Flávio Marques

Acompanhamento de nove meses de gestão – Finanças do SPFC

Na página da “Transparência”, do website oficial do São Paulo Futebol Clube, está disponível o relatório financeiro referente aos meses de janeiro a setembro de 2021. Na posse da atual administração havia grande expectativa de mudança nas práticas de gestão da Instituição, principalmente no tocante às finanças. A previsão orçamentária para o ano indicava um resultado do exercício positivo, com redução significativa na folha de pagamento do futebol, e uma diminuição importante no endividamento. Vejamos como foi o resultado parcial até o final de setembro.

Resultado do Exercício

A meta da diretoria era alcançar um superávit de R$ 24 milhões nos primeiros nove meses de gestão. O resultado obtido, porém, foi um déficit de R$ 71 milhões, isto é, R$ 95 milhões pior do que o previsto para o período.

Analisando os dados do relatório de atividades da diretoria, fica evidente que a maior parte do prejuízo apurado é devido ao gasto excessivo com a folha de pagamento e direitos de imagem do time de futebol profissional. Comparando com o mesmo período do ano passado e com a previsão orçamentária, o que vemos é que o plano era de redução de 15% das despesas com pessoal no futebol, mas que o realizado foi 36% superior ao gasto no ano anterior.

A tabela acima mostra que os gastos com pessoal e direitos de imagem excederam em R$ 69 milhões o valor projetado na previsão orçamentária. O custo médio mensal excedeu os R$ 20 milhões, valor elevadíssimo mesmo para os times de ponta do futebol brasileiro.

O gasto excessivo não se refletiu em melhor desempenho esportivo. A conquista do Campeonato Paulista, em abril, não teve o efeito duradouro de fortalecer o moral da equipe, como esperavam os dirigentes, nem deu retorno financeiro significativo.

Reconhecidamente, hoje o Paulista não passa de um evento de pré-temporada, em que os principais adversários não dedicam seus melhores esforços. Em termos práticos, foi um torneio em que apenas os dois jogos da final tiveram alto nível de competição. O SPFC venceu com méritos aquela final, utilizando um elenco formado em grande parte por jogadores formados em Cotia, portanto um time de baixo investimento, mas competitivo.

O descontrole da gestão do elenco se mostrou por meio de contratações como Orejuela, William e Eder, todos jogadores de salários altos, mas que produziram muito pouco até agora no Tricolor. Decisões como a renovação de contrato de Rojas, ou mesmo a recente substituição da comissão técnica, também geraram custos adicionais sem ter um benefício visível para o time.

Nas empresas, e mesmo outras organizações, a previsão orçamentária existe para ser seguida. Um prejuízo desses não ocorre do dia para a noite, mas vai sendo construído ao longo do tempo. O que fizeram nossos gestores quando, mês após mês, a Instituição seguia apresentando déficits? Que ações foram tomadas pela diretoria e pelo Conselho de Administração para evitar, ou ao menos minimizar, os maus resultados financeiros do Clube? Não sei o que foi feito, mas não foram ações eficazes.

Endividamento

Outro aspecto essencial para o sucesso a longo prazo do SPFC é o equacionamento da dívida do Clube. Esperava-se uma gestão mais austera, que focasse na redução do endividamento, além do alongamento dos vencimentos das obrigações. Passados nove meses da atual gestão este é o quadro geral do endividamento.

Com sucessivos prejuízos mensais, e obrigações de curto prazo para honrar, o Clube precisou aumentar seu endividamento, ao invés de reduzi-lo. Por endividamento líquido entende-se o total de obrigações (a pagar) da Instituição menos o total de direitos (a receber) em uma determinada data. O SPFC, ao final de setembro de 2021, devia R$ 55 milhões a mais do que no encerramento do ano 2020.

Os principais componentes dessa dívida atualmente são as obrigações empregatícias, os débitos com Instituições Financeiras e os valores devidos a entidades desportivas, terceiros e intermediários. Vejam o detalhamento de como evoluiu cada uma dessas contas neste ano.

O aumento substancial do saldo da conta de Obrigações Empregatícias, de R$ 62 milhões em nove meses, é consequência do aumento das despesas de folha, do aprovisionamento de encargos como o 13º, férias, abonos, mas deixa uma suspeita de que possa continuar havendo atrasos no pagamento de salários ou encargos sociais referentes a este ano.

Sobre as dívidas com Instituições Financeiras, o valor mais do que dobrou no período, chegando a R$ 153 milhões. No próprio relatório da diretoria existe a informação que o Clube tomou este ano um total de R$ 154 milhões em empréstimos, que foram utilizados para liquidar dívidas antigas como as referentes a contratações de Tchê Tchê, Pablo, Volpi, Kaká, acordos judiciais cíveis e trabalhistas, intermediários, entre outras obrigações.

O preocupante é que o estoque de dívida com Entidades Desportivas, Terceiros e Intermediários permaneceu quase igual, no valor de R$ 165 milhões, apenas R$ 8 milhões a menos do que o valor recebido como “herança” da gestão anterior. Isso se deve ao fato de que, para cada dívida paga, o Clube assumiu uma nova obrigação. Dessa forma, se pagamos ao Dínamo Kiev o valor que devíamos pelo Tchê Tchê, agora devemos ao Cruzeiro pela contratação do Orejuela, ao Elche pelo Rigoni, e por aí segue.

As dívidas elevadas causam um grande impacto nas despesas financeiras da Instituição. No período da análise o valor total dispendido com encargos financeiros chegou a 39 milhões, excedendo em R$ 13 milhões o valor previsto no orçamento.

Conclusão

Os resultados financeiros do SPFC continuam ruins, pois as práticas de gestão continuam as mesmas que vinham sendo aplicadas.

Ao invés de valorizar os jogadores disponíveis no elenco, a diretoria preferiu investir em contratações, com alta taxa de insucesso. Dos nove atletas trazidos este ano para o time profissional – Bruno Rodrigues, Orejuela, William, Benitez, Miranda, Eder, Rigoni, Calleri e Gabriel Neves – apenas três são considerados titulares do time (Miranda, Rigoni e Calleri). O Clube inchou a folha de pagamento com novos atletas, enquanto ainda deve o equivalente a três meses de salário referentes a 2020 aos atletas que já estavam aqui no ano passado. Atitudes como essa prejudicam a harmonia do grupo de jogadores.

Trocamos dívidas antigas por dívidas novas, sem amortizar o principal, e com alto custo financeiro nesta fase de aumento dos juros de mercado.

O ciclo de más contratações, fracassos esportivos e financeiros e pagamentos elevados de juros continua.

Como mudar esses resultados?

A solução é de médio prazo. A diretoria teria que equilibrar receitas e despesas, montando o time de futebol usando como teto de gastos as receitas recorrentes – TV, Patrocínio, Bilheteria e Sócio Torcedor – formando um time mais modesto, mas que possa competir nas Copas e apresentar uma campanha digna, mas sem grandes aspirações, nos pontos corridos. Nesse cenário o suporte total da diretoria à comissão técnica e jogadores será essencial. As receitas excepcionais, que não controlamos, como a venda de jogadores e premiação em competições, seriam direcionadas integralmente a amortizar as dívidas do Clube. Seguindo esse roteiro o SPFC, a médio prazo, poderia recuperar sua viabilidade econômica e esportiva.

6 comentários em “Flávio Marques

  1. É impressionante como em dez anos de administrações incompetentes podem arruinar uma instituição como um grande clube. Fosse uma empresa, já tinha pedido recuperação judicial ou aberto processo de falência.

    Fora a contratação de jogadores caríssimos que não tem condições de atuar no São Paulo, o ponto alto, ou melhor o ponto mais baixo, da incapacidade de gestão é que estamos pagando o dynamo pro Tchê Tchê ser campeão no atlético, e, com o Luan machucado, não temos um volante que preste.

    Lendo este balanço, fiquei ainda mais pessimista. Austeridade e comedimento nos gastos não combinam com a vaidade dos dirigentes tricolores.

    • Impressionante a incapacidade de administrar o clube da turma liderada por Leco, Casares e Cia. A grande culpa do que está acontecendo no São Paulo são dos conselheiros omissos e complacentes com essa indigna administração, que além de levar o São Paulo ao caos financeiro, tem cheiro de corrupção pairando no ar. Nosso São Paulo não merece isso!

      • Obrigado André Felipe e José Luiz pelos comentários.

        Os números são claros ao mostrar que austeridade não é uma marca dessa administração. Sobre possíveis atos de corrupção, esse é um tema para as autoridades, e nada posso afirmar

        Abraços.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

*