Milton Cruz: ‘Sei que, se pedisse uma chance, o Juvenal me colocaria’

Depois de uma semana agitada, Milton Cruz fez questão de ficar em casa no domingo de folga. Nada de churrasco, apenas um almoço com a família e amigos mais próximos. Mas nem quando não precisa trabalhar, o atual técnico interino do São Paulo consegue se desligar do futebol.

Por telefone, ele atendeu à reportagem por cerca de meia hora. No entanto, fez uma exigência:

– Me liga depois do jogo.

O jogo em questão era a final da Eurocopa, entre Espanha e Itália. Partida assistida com atenção, e que, segundo ele, sempre serve para tirar algum proveito para o dia a dia do futebol brasileiro.

E sorte que Milton Cruz não se cansa de ver jogos. Para enfrentar o Cruzeiro, ele assistiu por diversas vezes a íntegra dos jogos da equipe mineira contra o Vasco (vitória por 3 a 1, fora de casa) e Figueirense (triunfo por 1 a 0, em casa).

Para vencer o então líder do Brasileirão, que estava invicto, o sábado de Milton começou às 7h30. Após tomar café na concentração, ele voltou para seu quarto onde viu pela última vez os últimos dois jogos da Raposa, antes de finalizar material para a palestra aos jogadores.

Rotina de um técnico profissional. Mas essa definição não deve fazer parte da vida do auxiliar-técnico do Tricolor. Há 18 anos na função, ele admite que Juvenal Juvêncio até daria uma chance a ele como treinador, mas isso não está nos planos de Milton Cruz, que prefere continuar ajudando o clube nas contratações e o futuro técnico, que não deve demorar a chegar. Confira a entrevista exclusiva:

Qual é o sentimento nesse dia de folga, depois de vencer o Cruzeiro por 3 a 2, em Minas?

Estou recebendo muitas ligações, vários amigos me parabenizando e elogiando. Fiquei em casa com a família, curtindo com meu filho. Estou muito contente com o resultado que conseguimos em Minas.

Você teve três dias para trabalhar a equipe. Conseguiu fazer o que queria e o time correspondeu às instruções que passou?

O time correspondeu direitinho o que foi treinado durante a semana. No coletivo, eu corrigi o posicionamento do Douglas e do Cortez. Treinamos bastante a bola parada na sexta-feira, mas é lógico que falhamos. Foram falhas individuais e os jogadores sabem disso. Mas também tem o mérito do cara que fez o gol (Rafael Donato, zagueiro do Cruzeiro, que tem 1,92m de altura). Ele é grande, cabeceia bem e isso dificulta bastante. Já conversamos e vamos corrigir isso. Armei a marcação em cima do que era o time do Cruzeiro. Lucas no Charles, Jadson no Leandro Guerreiro. Douglas e Cortez tinham de bater lateral com lateral. Denilson ficou no Montillo e o Maicon com o Tinga. o Fabinho ficava com João Filipe, porque tem velocidade. E o Wellington Paulista era marcado ou pelo Rhodolfo ou pelo Edson Silva.

O time jogou com três zagueiros. Aprovou o esquema?

Quando você joga com três zagueiros, corre o risco de perder o meio para o adversário. Por isso, jogamos no 3-6-1, com o Lucas voltando bastante e marcando o volante deles para fechar o meio de campo. Também pedi para o Douglas e o Cortez fecharem e ajudassem a criar as jogadas, para que eles não tivessem muito espaço no meio de campo.

Você disse que recebeu diversas ligações de outros técnicos antes do jogo. O que eles te falaram. Pediu algum conselho?

Com o Ricardo Gomes, eu conversei na sexta à noite. O Muricy me ligou, o Paulo Autuori e o Carpegiani também. É por isso que eu falo da importância de ser honesto, trabalhar na sua função, não se intrometer no que não te compete. Todos os treinadores que passam pelo São Paulo são meus amigos, nenhum saiu como meu inimigo.

Você quer assumir como técnico efetivo do São Paulo?

No momento, acho que a diretoria está atrás de um treinador, estamos em busca. Sei que, em breve, vamos ter um nome. E eu vou continuar no meu cargo. Tenho o apoio dos jogadores, porque eles têm confiança em mim. Mas essas coisas deixo sempre na mão da diretoria. O que eles resolverem, eu vou acatar. Eles sabem o que é melhor para o São Paulo e o que é melhor para a minha carreira no clube.

Mas não sente nem um pouco de vontade depois de uma vitória em que os jogadores te abraçaram no fim da partida? Durante a semana, o Luis Fabiano disse que, se você assumisse, teria condições de levar o time à Libertadores.

Dá vontade de estar com eles e ajudá-los. Eu sei da confiança que eles têm no meu trabalho, e eles sabem da minha capacidade. Em 2003, depois de dez anos fora da Libertadores, eu e o Rojas levamos o time para a Libertadores. Na época, não era um time tão forte como o de agora. Foi mais na base do trabalho. Um time não se monta da noite para o dia, tem de ter paciência. Esse time de agora tem grandes jogadores. Não é qualquer um que tem Lucas, Jadson, Luis Fabiano e Rhodolfo. Mas a maioria é de jovens, e é preciso ter paciência. A média de idade do time é baixa. Eles sentem em alguns jogos como o da Portuguesa, em que houve muita pressão. Mas são grandes jogadores.

Se o Juvenal te chamasse na sala dele e perguntasse se você quer assumir o time. Qual seria a sua resposta?

Eu sei que ele não vai fazer isso comigo porque sabe da minha importância na função que tenho no clube. Eu sei que, se eu pedisse uma chance, ele me daria uma oportunidade. Mas eu estou muito feliz no que faço dentro do clube e tenho reconhecimento na minha função.

Já está pensando no jogo contra o Coritiba ou acha que até lá a diretoria já vai ter contratado um novo treinador para o clube?

Não, já estou pensando no Coritiba. Não posso ser pego desprevenido. Eu já conheço bem a equipe deles, jogamos duas vezes agora na Copa do Brasil, mas vou estudar mais. Assistir outros jogos deles. E também, se for o caso de vir outro treinador, terei boas informações para passar pra ele e ajudar na preparação do time para o jogo.

Depois do jogo, você citou a importância do Rogério Ceni. Dá para ter noção do tamanho da falta que ele tem feito nesses seis meses sem poder entrar em campo?

Ele é muito importante porque tem um carinho muito grande por todos no clube. Nos treinamentos, os jogadores gostam da participação dele. Ele é o líder, tem uma liderança muito grande, e tem de estar junto do time. Eu gostaria que estivesse todos à disposição. Ele, o Fabrício, o Wellington e o Cañete. Mas o Rogério Ceni é importantíssimo para todo o nosso time.

O Rogério participou do rachão e de um treino com o grupo nesta semana. Foi você quem pediu a presença dele ou ele quem disse que queria treinar?

Ele falou: “Miltão, eu vou lá com vocês, tem algum problema?” Eu disse que não tinha nenhum, pelo contrário, vamos sim. O médico liberou pra que ele fosse. A gente nunca faz as coisas sem consultar o departamento médico. E achei legal ele estar junto do time.

Acha que ele tem condições de voltar a jogar em julho?

Ainda não sei. Isso vai depender da evolução dele. Está indo muito bem, e espero que possa. Mas vai depender dos treinos do dia a dia, das simulações de jogo.

O seu choro depois do jogo foi um desabafo pelas críticas da torcida contra a Portuguesa?

Aquilo ali é coisa que já passou. Não foi coisa da torcida, foi de três ou quatro. Não me afeta, porque  tenho a confiança de pessoas mais importantes no clube. Juvenal, João Paulo, Adalberto, todos eles sabem do meu caráter e da minha honestidade. Não é a torcida porque sempre que estive no comando, me apoiaram. Eles sabem o que já fiz pelo clube. Dei retorno como jogador, que joguei por sete anos no clube e também na minha função, que tenho há 18 anos. Eu ando na rua, e todos me elogiam. Até torcedor de outros clubes pedem para que eu fosse do time deles. Então, eu não me preocupo com isso e já passou.

 

 

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