Torcedor viaja de Roraima a SP para adeus a Ceni… que não vai acontecer

Quando o professor Walfre Junior subiu ao altar e ficou de frente para a mulher que era o grande amor de sua vida, ele percebeu que não conseguiria dizer a palavra mágica. Quando lhe perguntaram se aceitaria Ana Claudia Costa como sua legítima esposa, se a respeitaria para todo o sempre, Walfre quis dizer sim, mas a voz não saiu da garganta.

Um dos culpados se chama Rogério Ceni. Dois dias antes do casamento, o São Paulo havia sido campeão da Libertadores ao golear o Atlético-PR. Ceni havia defendido um pênalti – ou assim Walfre acreditou durante nove anos, até sexta passada (na realidade, a bola foi na trave e o professor nem percebeu: “Eu devia estar bebum”, admite).

Campeão, ele gritou. Muito. Na euforia da celebração, horas e horas de urros descontrolados, as cordas vocais de Walfre foram aos poucos se tornando incapazes de articular sons.

O time ganhara um título, o torcedor perdera a voz.

Ainda assim, teria que casar. Praticamente mudo, atravessou a cerimônia na igreja, a festa e a lua de mel. Em silêncio, apenas sorria ao lembrar as defesas de Ceni, os gols de Amoroso, Luizão, Tardelli e Fabão. Murmurou seu sim discreto a Ana Claudia. Era quase um conto de fadas. “Foram os dois dias mais felizes da minha vida: a final da Libertadores e meu casamento.”

Nove anos depois, ele, Ana Claudia e sua filha Alícia viajaram desde Boa Vista, em Roraima, onde moram, até São Paulo (seis horas de avião, três mil quilômetros de chão) especialmente para ver o ídolo jogar aquela que seria sua última partida no Morumbi, o duelo contra o Figueirense, no domingo. Para torcedor que vive do outro lado do país, estar com seu time nunca é fácil.

Compraram as passagens em setembro. Reservaram o hotel logo depois.

Chegaram a São Paulo na última quinta-feira. Na sexta de manhã, Ceni decidiu não se aposentar mais. Renovou contrato até agosto de 2015, atendendo a pedidos da torcida.

Na sexta à tarde, Walfre continuava radiante quanto à possibilidade de ver o ídolo no Morumbi, mesmo em um jogo tornado banal, que servirá apenas para cumprir a tabela do Campeonato Brasileiro. “Ele decidiu ficar para ser campeão da Libertadores de novo.”

O torcedor jura que não ficou nem um pouco (nem um pouquinho mesmo!) triste por ter despendido quase R$ 4 mil reais na aventura paulistana, programada para chegar ao ápice em uma tarde histórica no domingo, o último jogo de Ceni no Morumbi.

Arquivo pessoal

Ele já comprou a camiseta especial, batizada de “a última camiseta de Ceni” ou de “a camisa da despedida de Ceni”, mas que agora virou só mais um produto em homenagem à carreira do goleiro.

Walfre garante não estar frustrado. E quando fala sobre o amor que sente pelo São Paulo, quando fala da idolatria ao capitão, fica claro que não há frustração nenhuma mesmo.

“Meu marido é supercalmo, tranquilo, nunca faz loucura nenhuma no dia a dia”, garante Ana Cláudia. “Só quando se trata do São Paulo.”

No ano passado, quando eles voltavam de férias no Rio de Janeiro, desceram do avião para uma conexão no aeroporto de Guarulhos rumo a Boa Vista. Na pista de pouso, Walfre teve uma ideia: “Por que não ficamos para ver o jogo do São Paulo amanhã?”

Ficaram. Viram o jogo. Ganharam do Mirassol na estreia do Campeonato Paulista e acabaram presos quase uma semana na capital porque não há muitas opções de voo para Boa Vista e eles tiveram que esperar.

Um ano depois, já sabiam que estariam de volta a São Paulo para ver o time de perto outra vez. Quando começaram a surgir as primeiras notícias sobre a aposentadoria de Ceni, encontraram a oportunidade perfeita. Olharam a tabela do Brasileiro e fizeram toda a programação para dizer adeus ao ídolo.

Ainda sonham conseguir entrar no centro de treinamento para ver Rogério Ceni de perto, quem sabe tirar uma foto, pegar um autógrafo do capitão. Alícia, de 5 anos, ainda não entende muito bem o que significa Rogério Ceni. Ela gosta mais de outro são-paulino famoso. Fez questão de embarcar na aventura boleira do pai só para voltar a encontrar quem ela chama de “meu amiguinho”: o Santo Paulo, mascote do time, um beato barbudo que costuma animar os jogos no Morumbi. Ele também não fala.

 

Fonte: Uol

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