Juiz crava que Pimenta tentou lesar o clube, mas São Paulo absolveu

“Eu reconheci que o Pimenta pediu dinheiro”. A frase dita agora pelo ex-juiz e professor de direito penal Luiz Flavio Gomes confirma a sentença escrita por ele em 1997, em ação de difamação movida pelo ex-presidente do São Paulo e atual candidato José Eduardo Mesquita Pimenta contra o empresário Francisco Monteiro, o Todé. Todé gravou conversa na qual o dirigente supostamente pedia comissão na venda de Mário Tilico para Espanha.

A decisão da Justiça, entretanto, acabou sendo ignorada pelo conselho do São Paulo, em um processo que teve em Juvenal Juvêncio um de seus grandes articuladores – o atual presidente e adversário nas eleições de abril Carlos Augusto de Barros e Silva, o Leco, era aliado político de Juvenal. Com base em um laudo pericial que apontava que a fita tinha cortes e edições, o Conselho Deliberativo readmitiu e inocentou Pimenta em dezembro de 1997. Leco fez parte da comissão que puniu Pimenta, mas depois votou a favor da volta.

Segundo conselheiros que viveram a época, o movimento pela volta do ex-presidente teve o apoio de Juvenal como parte de uma manobra para ganhar força política no clube e somar votos suficientes para vencer a eleição seguinte. Os dois se afastaram politicamente depois, e hoje Pimenta aparece como candidato de oposição ao grupo de Leco, remanescente de Juvenal. Conselheiros que participaram da votação que readmitiu o cartola não se recordam se a decisão judicial foi reconhecida ou comentada na votação, que foi secreta.

O laudo usado para inocentar Pimenta no clube, entretanto, não convenceu o juiz responsável pelo julgamento da ação judicial de sua inocência. À reportagem, Luiz Flavio Gomes afirma que não existe nenhuma dúvida quanto ao pedido de comissão indevida pelo ex-presidente são-paulino. Segundo Gomes, apesar do laudo apontar corretamente a edição de trechos da gravação, isso não exclui o fato de que Pimenta teria “pedido dinheiro”.

A campanha Volta Pimenta discorda frontalmente dessa posição (comunicado oficial está públicado no fim da reportagem), e apresentou ao UOL Esporte a íntegra do laudo pericial da Unicamp. O documento, assinado pelo perito Ricardo Molina, aponta que há cortes, interrupções e quebras na falas de Pimenta, fruto de manipulação, edição do conteúdo. Para o especialista, a fita não deveria ser admitida como prova.

“Reconheci que o Pimenta pediu dinheiro. Havia provas disso”, diz juiz

Então juiz da 26ª Vara Criminal de São Paulo, Luiz Flavio Gomes julgou improcedente a ação de difamação de Pimenta contra Todé. Na sua decisão, aponta que as acusações do empresário eram verdadeiras, e que o dirigente havia pedido comissão. “É o bastante para admitir como verdadeiros, ao menos, vários trechos das conversações”, diz a decisão;

“Eu reconheci que o Pimenta pediu dinheiro. Foi feita a gravação, e lá em Campinas, se constatou que era autêntica a voz, era dele mesmo. Houve montagem na fita, mas o que ficou ali era verídico. A edição não exclui o fato dele ter pedido dinheiro, por isso reconheci isso na sentença. Havia provas disso”, explica Gomes.

Especialista em direito penal, Gomes afirma não compreender o motivo da volta do ex-presidente aos quadros do clube – o processo foi conduzido por Juvenal Juvêncio e seu grupo, e teve voto favorável do atual presidente Carlos Augusto de Barros e Silva, que havia votado antes pela cassação.

“O que Todé falou era verdadeiro. Eu reconheci a veracidade do que foi dito contra o Pimenta. Ele dizia que o Pimenta teria pedido dinheiro, e não havia dúvida disso, então absolvi o Todé. Julguei em cima do laudo, minha sentença tinha fundamentos sólidos. Se ele foi absolvido internamente é puro corporativismo, coisa do clube”, diz Gomes.

“Era esburacada demais, tinha muita edição”, diz perito, sobre gravação

O laudo assinado pelo perito Ricardo Molina não analisa o conteúdo das conversas, apenas atesta que há indícios claros de edição e manipulação em diversos momentos. A conclusão do documento é de que “as fitas questionadas não podem ser consideradas autênticas, em função do grande número de interrupções, falhas e quebras de continuidade na gravação e, eventualmente, na própria continuidade discursiva. Todas as evidências indicam que houve algum tipo de manipulação do conteúdo original dos diálogos”.

“A gravação tem interrupções, algumas claras, outras nem tanto. Houve claramente manipulação, com intuito de fraudar. Era uma coisa até meio escandalosa: equipamento usado pelo Todé para gravar emitia um som a cada 15 segundos, mas esse sinal, que deveria ser regular, não estava batendo. Essa era fita esburacada demais para aceitar, não era uma falhazinha, ela foi bem mexida, tinha muita edição”, diz o perito.

Para Molina, a manipulação em vários momentos da conversa é suficiente para que a gravação não possa ser admitida como prova, nem para condenar Pimenta, nem para absolver Todé.

“É uma discussão até hoje no Brasil. Se você constata que a gravação não é boa tecnicamente, em outros países tem que ser abandonada como prova. Aqui, em geral, depende do juiz. A minha opinião pessoal é que se é provado que a gravação foi editada de forma fraudulenta, alteração de ordem, etc., não pode ser admitida. Nesse caso, então, ela ainda foi gravada, editada e entregue pelo próprio Todé. O juiz poderia ter pedido a ele a fita original. Se há edição, supressão, é porque há algo que quer esconder”.

Campanha de Pimenta repudia e contesta decisão de Luiz Flavio Gomes

A campanha de José Eduardo Mesquita Pimenta enviou à reportagem comunicado rebatendo a decisão e as falas de Luiz Flavio Gomes, questionando a visão do jurista. O UOL Esporte pública na integra a nota:

“Sobre as denúncias e acusações requentadas contra a campanha do candidato José Eduardo Mesquita Pimenta temos os seguintes esclarecimentos:

– É lamentável que um tema superado e que foi encerrado pelo próprio Conselho Deliberativo do São Paulo seja resgatado com fins eleitorais e para atingir uma candidatura embasada em propostas para tirar o São Paulo do atraso e da inércia que se encontra nos últimos anos. Gostaríamos muito de ver uma comparação da Gestão Pimenta x Gestão Leco.

– Laudo pericial assinado pelo perito criminal Ricardo Molina comprova que a fita utilizada como prova pela acusação, no caso o empresário Francisco Monteiro, o Todé, contém indícios incontestáveis de manipulação e adulteração. O material fonográfico analisado, no caso uma fita com diálogos entre Pimenta e Todé, apresenta cortes, interrupções, falhas e quebras de sequência que inviabilizam seu uso como prova da prática de algum ato ilícito.

– Na Queixa-Crime por calúnia e difamação que Pimenta moveu contra o empresário, o juiz Luiz Flávio de Oliveira, da 26º Vara Criminal de São Paulo, atesta em sua decisão que a fita usada como prova de que Pimenta teria supostamente cometido ato ilícito foi obtida de forma clandestina. Segundo palavras do próprio magistrado, o material “não serve para condenar ninguém”.

– Após apresentar provas de sua inocência nos casos nos quais foi acusado, em 01 de dezembro de 1997 o ex-presidente teve sua punição tornada sem efeito e seus direitos reestabelecidos pelo próprio Conselho Deliberativo do SPFC. Com essa decisão ele voltou a exercer suas atividades no clube. Desde 2015 preside o Conselho Consultivo do São Paulo, instituição que reúne os presidentes do clube. Seu mandato no Conselho irá até 2020″

 

Fonte: Folha SP

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